A 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) negou um recurso da Google Brasil Internet Ltda. e manteve a decisão que a obriga a excluir o endereço de um site fraudulento e a apresentar registros de conexão vinculados ao domínio. A sentença original havia sido proferida pela 2ª Vara Cível da comarca de Tijucas.
O Caso: URL Fraudulenta Usando Marca de Empresa
A Google foi acionada judicialmente por permitir o registro de uma URL (endereço de internet) que estava sendo utilizada para aplicar fraudes. O site em questão usava a marca e a identidade visual de uma empresa de suplementos alimentares, enganando consumidores.
A magistrada relatora do caso no TJSC rejeitou os argumentos preliminares da Google, como a ilegitimidade passiva (alegação de que não deveria responder pelo processo), a perda superveniente do objeto (alegação de que o problema já havia sido resolvido) e a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Para a relatora, a atuação da Google vai além de uma simples função registral; a empresa é uma parte integrante da cadeia técnica que viabiliza a presença de um site na internet. Dessa forma, está sujeita a deveres de cooperação técnica e jurídica, especialmente diante de ordens judiciais válidas.
“O serviço de registro – por mais distante que esteja da camada de hospedagem – é parte da cadeia de disponibilização e, por isso, está sujeito ao dever de cooperação, nos limites de sua atividade”, assinalou a relatora em seu voto.
Controle Técnico e Dever de Responsabilidade Proporcional
A relatora destacou que, mesmo que a hospedagem do conteúdo fraudulento estivesse a cargo de uma terceira empresa, a Google possui controle sobre aspectos técnicos que garantem o funcionamento do endereço eletrônico. Esse controle permite à empresa desativar domínios comprovadamente ilícitos por meio de mecanismos como suspensão de DNS e bloqueio de redirecionamento.
“Exigir da Google a adoção de providências tecnicamente viáveis para desativar domínio sabidamente fraudulento, portanto, não excede sua função, mas apenas a adéqua ao grau de responsabilidade proporcional à atividade exercida”, concluiu a magistrada.
Além disso, a decisão reforça a obrigação da Google de apresentar os registros de conexão relativos ao domínio em questão no período de seis meses anteriores à data da sentença. A empresa havia alegado não possuir tais informações, mas a relatora entendeu que ela não comprovou, tecnicamente, a impossibilidade de fornecimento.
Avanço Metodológico e Marco Civil da Internet
O voto da magistrada se destaca por aplicar — de forma comparada, crítica e contextualizada — dispositivos do Digital Services Act (DSA) da União Europeia. Essa aplicação, fundamentada no artigo 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), confere uma densidade comparativa ao julgamento e sinaliza um avanço metodológico no enfrentamento de litígios envolvendo plataformas digitais.
“Reconhecer que os valores da proteção da informação, da segurança na rede e da responsabilidade institucional são partilhados por democracias contemporâneas não significa renunciar à soberania normativa, mas reafirmar que o Direito, inclusive em sua dimensão comparada, é instrumento de tutela da dignidade humana”, conclui o relatório.
O voto foi seguido de maneira unânime pelos demais integrantes da câmara, reforçando o papel do Marco Civil da Internet como instrumento de proteção coletiva e de responsabilização proporcional dos intermediários, utilizando precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e decisões recentes do próprio TJSC como parâmetro (Apelação n. 5003529-71.2023.8.24.0072).
Essa decisão em Santa Catarina é um marco importante para a responsabilização de registradoras de domínio e provedores de serviços de internet no Brasil, especialmente no combate a fraudes online e na proteção dos consumidores.
Fonte: TJ/SC