O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) firmou uma tese jurídica que deve guiar os julgamentos em Santa Catarina sobre a ação de usucapião. A decisão esclarece quando é possível usar a usucapião em situações de compra e venda informal de imóveis, ou quando há inexistência de matrícula e desmembramento do terreno. O entendimento, estabelecido pelo Grupo de Câmaras de Direito Civil em um Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), visa uniformizar interpretações jurídicas sobre o tema.
A nova tese jurídica do TJSC permite o ajuizamento de ações de usucapião mesmo quando existe um contrato de compra e venda. Contudo, essa possibilidade só é válida se houver um impedimento concreto e relevante que inviabilize a regularização do imóvel pelos meios tradicionais, como a escritura pública ou a adjudicação compulsória. Em outras palavras, não basta ter adquirido o imóvel sem a formalização completa; é crucial comprovar que a regularização não é possível por outros caminhos.
No caso específico que motivou a decisão, a parte autora alegava ter comprado o imóvel diretamente dos proprietários registrais, mas que não conseguia regularizar a propriedade pelos procedimentos administrativos convencionais. A justificativa era que o terreno fazia parte de uma área maior, sem desmembramento, tornando a declaração de domínio por usucapião a única solução.
Entretanto, o desembargador relator enfatizou que a usucapião é uma forma originária de aquisição da propriedade. Ela não pode ser utilizada para burlar exigências legais de parcelamento do solo, nem para evitar o pagamento de tributos e encargos cartorários relacionados à regularização de imóveis.
Segundo o magistrado, a aquisição derivada da propriedade (como uma compra) não impede automaticamente o ajuizamento da ação de usucapião. Isso, desde que fique demonstrada a existência de um impedimento concreto que inviabilize a transferência de propriedade pelos meios jurídicos e administrativos ordinários.
Pontos Chave da Decisão do TJSC sobre Usucapião:
A decisão uniformiza o entendimento em três pontos essenciais:
- Posse Originada de Contrato e Usucapião:
- Sim, a posse oriunda de um contrato pode justificar a ação de usucapião, desde que a parte comprove a existência de um óbice real e relevante que impeça a regularização por vias normais. Caso contrário, não há interesse processual.
- Usucapião para Imóveis Irregulares (Sem Matrícula/Desmembramento):
- Sim, é possível propor ação de usucapião para imóveis sem matrícula, sem desmembramento ou situados em áreas irregulares. A falta desses requisitos não impede, por si só, o reconhecimento da posse e a declaração de domínio.
- Uso Indevido da Usucapião (Evitar Despesas):
- Sim, o uso da usucapião é considerado indevido quando não há um obstáculo real à regularização do imóvel e serve apenas para evitar despesas cartorárias e tributárias. A decisão é clara: a usucapião não pode ser um atalho para fugir de custos com desmembramento, escritura, registro, ITBI, ITCMD ou outros tributos imobiliários, nem para driblar as regras de parcelamento do solo. A usucapião é admitida, nesses casos, somente se houver um impedimento concreto que inviabilize a transferência da propriedade pelos meios tradicionais, como escritura pública ou adjudicação compulsória.
O voto do relator também destaca que essa nova tese jurídica do TJSC passa a valer para todas as ações ajuizadas a partir da publicação do julgamento (processo 5061611-54.2022.8.24.0000).
Para mais detalhes sobre essa importante decisão, consulte o Informativo da Jurisprudência Catarinense.